Na CAIXA, 70% dos empregados atuam por meio do teletrabalho, de forma a evitar o avanço do novo coronavírus
A pandemia de coronavírus, que chegou ao Brasil no final de fevereiro mudou a rotina da população. Conforme as orientações das autoridades sanitárias, o distanciamento social é uma das principais formas de evitar a proliferação do vírus e diminuir os índices de pessoas infectadas.
Na CAIXA, 70% dos empregados foram colocados em home office, no último dia 22 de março, de forma a prevenir o avanço da pandemia e resguardar a saúde dos trabalhadores.
A Associação Nacional dos Advogados da Caixa Econômica Federal (Advocef) conversou com a psicóloga Érica Martins Marques Ramos, que explicou como o distanciamento social influencia na saúde mental da população, como manter a produtividade no regime de home office e as lições da pandemia para a sociedade. Confira.
Como a senhora avalia esse momento de distanciamento social proposto pelas autoridades como forma de conter os avanços do coronavírus?
As pessoas se viram numa situação em que a sua liberdade foi privada e de repente tiveram de mudar tudo aquilo que haviam programado, planejado e a rotina também foi mudada fora do seu desejo… as pessoas estão ficando em casa não porque querem mas porque estão sendo ‘obrigadas’.
Esse momento de crise desorganizou as pessoas nas suas rotinas. Todo mundo tinha como que um cronograma daquilo que ia fazer no dia: acordava, levava o filho na escola, ia trabalhar, almoçava, fazia um exercício, voltava pra casa no fim do dia, e essa rotina da família foi mudada diante da situação atual.
Isso tem algum impacto na saúde mental da população?
Sem dúvida nenhuma é um momento extremamente delicado em que muitos de nós não estávamos preparados para lidar com essa situação e claro que teve um impacto enorme na mente das pessoas de forma psicológica.
Muitos planos das pessoas foram tolhidos também. De repente alguém teve que procrastinar, protelar aquilo que estava planejando fazer por não poder concretizar. O que eu percebo é que as pessoas estão com muita dificuldade de se replanejar, reorganizar, de ter uma rotina diante disso, até porque não era algo esperado por ninguém.
Esse novo gera muita ansiedade nas pessoas, traz um desconforto, gera a insegurança e o medo de como será o amanhã podendo desencadear transtornos.
A questão financeira é outro ponto que afetou muito a vida das pessoas. A pessoa não sabe mais como pagar suas contas, é uma preocupação de profissionais autônomos, empregados que temem ser mandados embora… essa questão de não saber como lidar com o amanhã influencia o psicológico de tal forma a desestruturar.
Muitos trabalhadores precisam desempenhar suas funções por meio do trabalho em casa, em alguns casos o cenário é de pais com filhos pequenos no mesmo ambiente. Como conciliar a produtividade com a nova realidade do home office?
No trabalho em casa as pessoas não têm conseguido manter uma rotina e isso influencia demais no desempenho das atividades. Para dar certo necessário saber que a forma como trabalhava antes é diferente de como vai atuar em casa, pois existem vários fatores que podem causar distração.
A pessoa precisa ter uma flexibilidade muito grande para poder lidar com isso. É importante estar aberta às possibilidades e, com isso, tentar minimamente trazer uma organização, uma dinâmica de estar com os filhos, de se dedicar ao trabalho e lidar com as questões da casa. É preciso adaptar a rotina que tinha antes para esse contexto e essa situação familiar.
Nesse momento o que conta muito é a perspectiva, o olhar e a abertura da pessoa para o novo. É necessário entender que estamos vivendo uma outra realidade e que isso precisa ser readaptado para que seja possível trazer uma produtividade mais eficaz.
O que pode ser feito para amenizar o estresse do confinamento?
Criar uma rotina é um fator que auxilia para amenizar o estresse. É necessário cuidar da mente, mas também é importante cuidar do corpo, então, uma atividade física e uma boa alimentação são essenciais para isso. E é possível fazer atividade física em casa, pode ser uma dança com o filho ou sozinho, uma ginástica, um alongamento… a internet tem vários canais que ensinam como praticar exercícios em casa de forma segura.
A pessoa que fica ali muito tempo sentada, com muitas cobranças e dificuldades para ter essa flexibilidade acaba por não liberar substâncias químicas que são importantes e dão sensação de prazer. A gente percebe que as pessoas no teletrabalho acabam por não ter uma rotina alimentar, muitas vezes comem de frente ao computador, os horários são muito variáveis e pulam refeições.
Então, é primordial que as pessoas não abram mão de criar uma rotina, com horários específicos para cada atividade, ter o tempo certo para fazer suas refeições, buscar uma atividade física. É importante nessa dinâmica ela parar para ter o momento da alimentação, o momento da atividade, o momento de ficar com os filhos. Essa organização da rotina ajuda a nos organizarmos mentalmente.
Embora o mundo já tenha vivido outras pandemias, essa é a primeira que ocorre na era das redes sociais, meios repletos de conteúdos acerca do tema. É possível fazer algo para se prevenir ou se blindar da atmosfera de medo criada a partir dessa enxurrada de informações?
Esse clima de tensão e medo tem muito a ver com relação as Fake News que tem sido disseminadas por aí. As pessoas não têm tido cuidado com as informações que recebem e também têm sido poluídas mentalmente com muitas notícias, muitos números geralmente negativos e vão se abalando nesse sentido, absorvendo a negatividade e perdendo as esperanças, achando que vão acontecer só coisas ruins.
Esse medo vai sendo alimentado cada vez que a pessoa vai vendo os números trágicos e aquilo vai diminuindo a confiança e permeando o psicológico, aquilo vai crescendo a pessoa vai ficando insegura, achando que tudo de ruim vai acontecer, seja na área financeira, social, familiar.
É importante filtrar o acesso a essas informações, procurar fontes confiáveis e selecionar, também, a quantidade de informações, não apenas a qualidade.
Na sua avaliação, qual a grande lição dessa realidade de confinamento para a sociedade de hoje?
Claro que tem o lado negativo, mas também é possível enxergar o lado positivo dessa situação. Com tudo isso estamos reavaliando e reaprendendo algumas coisas. A gente observa que muitas pessoas têm reativado relações que estavam perdidas, muitas vezes, pela correria do cotidiano.
Temos visto pessoas ampliando suas possibilidades de trabalho, se reinventando como profissionais. É um fator fantástico, porque as pessoas começam a desenvolver e melhorar habilidades que antes estavam esquecidas, e diante dessa situação elas se reinventam, isso é muito interessante, essa possibilidade do ser humano de se redescobrir. E isso tem ocorrido na área profissional, nas relações pessoais. Talvez as pessoas estejam mais conectadas emocionalmente do que há alguns meses atrás, talvez há algum tempo atrás as relações estivessem muito mais superficiais, mesmo tendo contato físico.
Nesse momento muitos pontos começam a ser questionados, e as pessoas começam a reavaliar muitos pontos que são importantes, interessantes e favorecem para esse crescimento. Tudo isso é um aprendizado. O ser humano é fantástico, se adapta a diversas situações e acredito que vamos sair disso e nos superar.