Essa coluna nasceu no início de 2021 para ser um espaço de diálogo sobre educação financeira com foco nos investimentos em renda variável, discussão sobre os seus riscos e as suas vantagens, apresentação de algumas das ferramentas de análise dessa classe de ativo, desmistificação do mercado, sugestão de livros sobre investimentos e debate acerca dos fundamentos teóricos do mercado de ações, trazendo números, gráficos, histórias de investidores de sucesso, pesquisas da área e outros assuntos que possam servir de apoio àqueles que já investiram e desistiram ou a quem nunca tenha pensado em investir na Bolsa de Valores.
Isso tudo seguindo uma estratégia de investimento de longo prazo em renda variável com foco na construção de patrimônio e de independência financeira.
Resta indagar, todavia, o que significa de fato a expressão “longo prazo”?
John Maynard Keynes, economista inglês, cunhou uma frase que se tornou célebre entre os colegas de profissão e as pessoas que estudam sua obra: “[O] longo prazo é uma orientação enganosa para a atualidade. No longo prazo, todos estaremos mortos”[1].
Claramente Keynes não remetia à dimensão do investidor individual ao externalizar tal pensamento. Portanto, apesar de provocadora e instigante, sua expressão não se adequa perfeitamente a esse objetivo: o de buscar entender, para o investidor individual de renda variável, a noção de “longo prazo”.
A esse respeito, uma pista melhor pode ser extraída da arguição de Jeremy J. Siegel. No livro “Investindo em Ações no Longo Prazo”, o professor não chega a conceituar o que seria para ele o “longo prazo”; mas oferece um indicativo no seguinte trecho: “Para muitos investidores, a forma mais significativa de considerar o risco é por meio da representação do pior cenário possível. Os melhores e piores retornos, descontada a inflação, de ações, dívidas de longo prazo e letras desde 1802, em horizontes de investimento de 1 a 30 anos, são exibidos na Figura 6.1 […] As ações são inquestionavelmente mais arriscadas do que os títulos ou as letras do Tesouro ao longo de períodos de um ou dois anos. Entretanto, em todos os períodos de cinco anos de 1802, o pior desempenho das ações, em -11,9% ao ano, foi apenas um pouco pior do que o pior desempenho dos títulos de longo prazo ou das letras. E para horizontes de investimento de dez anos, o pior desempenho das ações na verdade foi melhor do que o dos títulos de longo prazo e das letras. Com relação a horizontes de 20 anos, os retornos das ações nunca ficaram abaixo da inflação, enquanto os retornos dos títulos de longo prazo e das letras uma vez chegou a cair 3% ao ano, abaixo da taxa de inflação”[2].
O gráfico 6.1 a que o autor mencionou segue abaixo:
A honestidade acadêmica impõe dizer que Jeremy J. Siegel faz uma análise do passado em relação ao mercado americano, circunstância que não pode ser replicada simplesmente a outros mercados e tampouco serve como parâmetro de previsão do futuro. Seja como for (ao que interessa a esse artigo), a transcrição – aliada ao gráfico – demonstra que o autor, ao tratar do “longo prazo”, remete a um período de pelo menos 10 (dez) anos de investimento. Não necessariamente 10 (dez) anos com os mesmos papéis na carteira, mas a um horizonte de investimento por pelo menos 10 (dez) anos, ainda que haja mudanças no portfólio de ativos no correr desse período.
A esse respeito, Warren Buffet já afirmou ser a eternidade o seu horizonte predileto de investimento, na medida em que a eternidade alija as oscilações de curto prazo e igualmente assegura tempo bastante para a maturação dos investimentos das empresas investidas.
Bolsa não é cassino! Se quiser tentar a sorte na Bolsa, é melhor e mais seguro jogar na Loteria. O mais adequado é o investimento em renda variável no longo prazo alinhado com o hábito de poupança periódica, paulatina e constante e uma estratégia clara de investimento visando à construção de patrimônio pessoal para alcançar a independência financeira.
Quem governa o curto-médio prazo no mercado de capitais são as emoções humanas e as especulações dos agentes econômicos. Já quem governa o longo prazo é a razão atrelada às estratégias de bons investimentos que amadurecem – e entregam resultados – com o tempo.
Em suma, quando falamos de investimento de longo prazo no mercado de capitais, estamos aludindo a um horizonte de pelo menos 5 (cinco) a 10 (dez) anos, seja em razão dos ciclos econômicos (que costumam durar anos) da economia, seja em virtude de ciclos eleitorais, seja ainda pelo fato de que as empresas são integradas por pessoas, processos, contratos e estruturas que não permitem “cavalos de pau” em suas trajetórias corporativas de atuação e de mercado.
Exercitar e desenvolver a paciência, portanto, é tarefa fundamental para o sucesso do investidor na renda variável.
Convém ter em mente que o modelo capitalista alimenta-se do seu próprio crescimento e as empresas bem-sucedidas tendem a expandir os seus negócios (com ou sem o lançamento de novos produtos) e a ganhar mercado com o passar dos anos.
Dúvidas, críticas ou sugestões, escreva para o e-mail colunainvestimentosemercados@advocef.org.br. Esse é um espaço aberto a todos e sua colaboração é fundamental! Invista no seu futuro aprendendo a investir.
Marco Aurélio Panadés Aranha
Investidor há mais de 10 anos do mercado de capitais
Formado em Administração pela FGV e Direito pela USP
@marcoaurelioparanha (Instagram)
Advogado
[1] A Tract on Monetary Reform. London: Macmillan, 1924, p. 80.
[2] Investindo em ações no longo prazo: o guia indispensável do investidor do mercado financeiro. Trad. Beth Honorato. Ver. Téc. Guilherme Ribeiro de Macêdo. 5ª ed. Porto Alegre: Bookman, 2015, p. 94.